domingo, 13 de setembro de 2015

AS VERTIGENS DE ROBINSON

   Desde a mais tenra infância que Robinson tinha vertigens. Pôr-se de pé em cima de uma cadeira bastaria para lhe provocar um certo mal-estar. Um dia, tinha querido visitar o campanário da catedral da sua cidade natal, York. Depois de uma longa escalada por uma escada íngreme e estreita, em caracol, vira-se bruscamente fora da sombra das paredes, em pleno céu, numa plataforma de onde se via toda a cidade,  com os seus habitantes do tamanho de formigas. Gritou, cheio de medo, e tiveram de o descer como um embrulho, com a cabeça tapada pela capa de estudante.
   Por isso, todas as manhãs se esforçava por subir a uma árvore, com o objetivo de perder o medo. Antigamente, teria achado este exercício ridículo e inútil. Mas, desde que vivia tomando Sexta-Feira como modelo, achava importante livrar-se daquela terrível tendência para as vertigens.
   Nessa manhã, escolhera uma araucária, uma das maiores árvores da ilha. Agarrou-se ao ramo mais baixo e içou-se, apoiando-se num joelho. Trepou depois dos sucessivos andares de ramagens, pensando que gozaria o nascer do sol um pouco mais cedo quando se encontrasse no topo da árvore. À medida que subia, sentia a árvore vibrar cada vez mais, e balouçar ao vento. A vertigem começou a contrair-lhe o estômago. Estava já próximo do cimo quando, de repente, se viu suspenso no vazio. Certamente por efeito de um raio, o tronco estava desprovido de ramos ao longo de dois metros. Cometeu então um erro que dificilmente se evita quando se teme a vertigem: olhou para baixo. Não viu senão uma confusão de ramos que pareciam desabar, girando como uma espiral. A angústia paralisou-o e agarrou-se ao tronco, apertando-o com os braços e entre as pernas. Compreendeu, finalmente, que devia olhar, não para baixo, mas sim para cima. Levantou os olhos. No céu azul, um grande pássaro dourado em forma de losango balouçava-se ao sabor do vento. Sexta-feira dera cumprimento à sua misteriosa promessa: fazia Andoar voar.

Michel Tournier, Sexta-feira ou a Vida Selvagem,
 Editorial Presença

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