quinta-feira, 1 de outubro de 2015

DIÁRIO DE ANNE FRANK



   Quarta-feira, 23 de fevereiro de 1944

   Minha querida Kitty,

   Desde ontem que o tempo está maravilhoso, e eu arrebitei um pouco. A minha escrita, a melhor coisa que tenho, está a andar bem. Vou ao sótão quase todas as manhãs para tirar o ar viciado dos pulmões. Esta manhã, quando lá fui, Peter estava ocupado com as limpezas. Terminou rapidamente e veio ter comigo. Eu estava sentada no chão, no meu lugar preferido. Olhámos os dois para o céu azul, para o castanheiro sem folhas, reluzente com o orvalho, para as gaivotas e outros pássaros, cintilando com reflexos prateados, enquanto planavam pelo ar, e ficámos tão comovidos e extasiados que nem conseguíamos falar. Ele estava de pé, com a cabeça encostada a uma viga, e eu estava sentada. Inspirámos o ar, olhámos para fora e sentimos ambos que o encanto não devia ser quebrado com palavras. Ficámos assim durante muito tempo e,  quando ele teve de sair para ir cortar lenha, eu tive a certeza de que ele era um rapaz bom e decente. Subiu as escadas para as águas-furtadas e eu segui-o; durante os quinze minutos em que esteve a cortar lenha, também não dissemos uma palavra. E eu fiquei de pé a observá-lo, e percebi que ele estava obviamente a esforçar-se para cortar a madeira da maneira certa e para exibir a sua força. Mas olhei também pela janela aberta, deixando os meus olhos vaguear por uma grande parte de Amesterdão, sobre os telhados e até ao horizonte, uma faixa de azul tão claro que era quase invisível.
   - Enquanto isto existir - pensei -, este sol e este céu limpo, e enquanto eu puder apreciá-lo, como é que posso estar triste?
Tua, Anne

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