quinta-feira, 22 de outubro de 2015

ÉS FELIZ?

12 de março

   A Vanessa chegou ao pé de mim e perguntou-me de chapa.
   - És feliz?
   Fiquei engasgada.
   - Sei lá se sou feliz...
   Realmente não sei. Acho que dantes, quando era pequena e ridícula, eu às vezes era totalmente feliz. Lembro-me de quando recebi a bicicleta com rodinhas de lado e obriguei o meu pai a levar-me logo para o Campo Grande. Como era feliz a pedalar, a sentir o vento na cara, a saber-me dona daquela máquina prodigiosa! Era tão feliz no Natal, a desembrulhar presentes, na praia a chapinhar na espuma...
   Hoje a felicidade é difícil de agarrar. Sonho com isto e aquilo tão intensamente que, quando acontece, se por acaso acontece, é felicidade em segunda mão, perdeu metade do sabor.
   - Tens tudo para ser feliz - dizem os meus pais - mas só refilas, embirras, irritas, nunca estás contente com nada.
   Encolho os ombros, não respondo a figuras de Museu.
   Olho para a televisão. Passa anúncios - gente feliz porque gasta lixívia, usa collants, lava os dentes. Feliz pela coca-cola, pelo papel higiénico, pelas batatas fritas, pelos inseticidas...
   O telefone toca.
   - Para quem há de ser? - diz a mãe. - É de mais, parece que os teus amigos não podem viver sem ti.
   - Talvez não possam - respondo eu, quase, quase, quase feliz.

Luísa Ducla Soares, Diário de Sofia & Cª.,
 Civilização Editora




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