domingo, 16 de agosto de 2015

0 MENINO E SEU PRESENTE

   Quando a mãe desceu do ónibus, o menino já estava esperando no portão do jardim. Avistou-a, veio caminhando. Em vez de correr, como todos os dias, andava com dificuldade, curvado para a frente, a mão direita debaixo da blusa.
   - Que foi, Bumba?
   - Nada não, mãe.
   A mãe percebeu logo que ele estava ocultando alguma coisa.
   - O que é que está escondido aí?
   - Pinto.
   - Pinto?
   - É sim, mãe. Olha ele aqui.
   A mãe ajudou-o a levantar a blusa de lã e, antes de ver, ouviu um piado fino. A mão do menino segurava de encontro ao peito um pintinho amarelo, de aparência muito safada.
   - Pode levar para casa não - avisou a mãe.
   - Pode sim, mãe. Eu ganhei ele.
   - Ganhou de quem?
   - A tia deu ele.
   - Deu para você?
   O menino não respondeu. O pinto estava piando debaixo da blusa. Ele pôs a sacola no chão e agora,  com a mão livre, procurava acalmá-lo:
   - Dorme, nenen.
   - A tia deu ele para você? - tornou a mãe.
   - Deu, mãe. Eu juro.
   - Está certo. Os outros meninos também ganharam?
   - Ganhou. Todo mundo ganhou..
   - Deus do céu - exclamou a mãe.
   Apanhou a sacola no chão e pegou o menino pela mão:
   - Vamos, meu filho.

Wander Piroli, Outras Vezes Também Nossas,
Boletim Cultural da Fundação Calouste Gulbenkian



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