TROVOADA
De todos os fenómenos meteorológicos que habitualmente assistimos é, sem dúvida, o relâmpago, e o trovão que o acompanha, o mais impressionante e pavoroso. Assusta olhar o céu, numa tempestuosa noite escura, e vê-lo de repente fender-se de alto a baixo, rasgado por um golpe de luz vivíssima que, num ápice, revela a paisagem oculta nas trevas, para de novo as mergulhar nas mesmas trevas. Mas, desaparecida a visão sinistra, logo rebenta sobre as nossas cabeças um estrondo medonho, um disparo repentino que se prolonga numa cavalgada sonora aterradora. É uma cena teatral, de grande espetáculo, que a natureza nos oferece de quando em quando.
Compreende-se os terrores que os homens do passado, ignorantes e desprevenidos, sentiriam perante a grandeza de tal acontecimento. Coisa vinda diretamente do céu, com tão espantosos efeitos, só poderia ser interpretada como manifestações de seres poderosíssimos que tinham nas mãos os destinos dos homens. O relâmpago era o sinal da existência de deuses que desse modo nos castigavam por qualquer ato que teríamos praticado e que não lhes agradara. O trovão era a sua voz ralhando connosco. Os nossos antepassados caíam de bruços implorando perdão para o mal que teriam feito e que nem sabiam qual fosse.
Rómulo de Carvalho, A eletricidade estática,
«Cadernos de Iniciação Científica», Editora Sá da Costa
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