sábado, 8 de agosto de 2020

 T


Triste trolha atrapalhado

De taipar tanta trapeira,

Consertar tanto telhado,

Estragar tanta goteira,


Na festa de Santo Entrudo

Entra trôpego e zoupeiro,

De tamancos tosco e rude,

No int'rior do seu palheiro.


Sentou-se num tamborete,

Sem dizer nem chuz nem buz,

E pôs-se a entrudar sozinho

Com tripas de atum de truz.


Eis trinta e três cães famintos

(outros dizem trinta e seis)

Entram de tropel ladrando

Que estrago!... Agora o vereis:


Trastes, trancas, tocos, troncos,

Estoiram... Tudo é torpe!

Bater, latir, tombos, roncos

Terminam este aranzel.


Exercícios de dicção



quarta-feira, 1 de abril de 2020

ADIVINHA

Na floresta ele se cria
e lá passa todo o dia;
na árvore que escolheu
guarda tudo o que é seu.
Tem a cauda levantada,
peluda e muito engraçada!
Põe-lhe uma avelã na mão
e ele não te dirá que não...

Quem é ele?Força!
Põe-te a pensar!
Sei que vais adivinhar!


quarta-feira, 11 de março de 2020

PESCARIA


Cesto de peixes no chão.
Cheio de peixes, o mar.
Cheiro de peixes pelo ar.
E peixes no chão.

Chora a espuma pela areia,
na maré cheia.

As mãos do mar vêm e vão,
as mãos do mar pela areia
onde os peixes estão.

As mãos do mar vêm e vão,
em vão.
Não chegarão
aos peixes no chão.

Por isso chora, na areia, 
a espuma da maré cheia.

Cecília Meireles, Ou Isto ou Aquilo


terça-feira, 5 de novembro de 2019

INFÂNCIA


Sonhos
enormes como cedros
que é preciso
trazer de longe
aos ombros
para achar
no Inverno da memória
este rumor
de lume:
o teu perfume,
lenha
da melancolia.

Carlos de Oliveira, Trabalho Poético

domingo, 13 de outubro de 2019

O computador

A menina Leonor
Só quer o computador.
O boneco e a boneca
Eram uma grande seca!
Deitou fora a bicicleta,
Cansa muito ser atleta.
Não sai para qualquer lado,
Nem para comprar gelado.
Anda da mesa para a cama,
Só se veste de pijama.
Vê-se ao espelho de manhã
A olhar para o ecrã.
Já se esqueceu de falar
Só sabe comunicar
Com os dedos no teclado.
Tem agora um namorado
A menina Leonor
Chamado computador.
É fiel, inteligente
Não refila, nunca mente.
E quando ela se fartar,
Pimba, basta desligar.

Luísa Ducla Soares, A Cavalo no Tempo,
 Ed. Civilização



domingo, 16 de junho de 2019

ADIVINHA

Quem vê lagarta
não sabe que um dia,
do casulo farta,
sai em euforia
com um corpinho belo,
azul, amarelo,
vermelho, vibrante
(mesmo estonteante)
e põe-se a voar...

Já sabes ou vais pensar?

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Resposta: a borboleta

segunda-feira, 10 de junho de 2019

MOTOCICLISTA

Não é ave, não é seta.
Espalma as duas mãos abertas
num guiador niquelado,
colado às horas despertas
que lhe segredam recados.
Não é ave, não é seta,
não é explosão de cometa
por um céu iluminado,
mas infiltra-se nas retas
com um lenço alaranjado,
perfumado de giestas,
ondulante e ondulado.
Não é ave, não é seta,
não é explosão de cometa
nem projétil disparado,
é um remendo de vela
sobre um mar encapelado,
uma centelha perpétua
que se prolonga no espaço.
Não é ave, não é seta,
não é explosão de cometa,
nem projétil disparado,
não é um homem com pressa,
faz parte da Natureza,
é um requinte do vento,
é um poema encarnado.

Isabel Pulquério

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