segunda-feira, 29 de junho de 2015

PAPAGAIO DE PAPEL

Deixem-no lá, deixem-no lá, o papagaio!
Deixem-no lá, bem preso à terra, vibrando!

Aos arranques,
a fazer tremer a terra,
a querer voar
pelo ar
até pertinho do Céu...

Deixem-no  lá, deixem-no lá, o papagaio!
Deixem-no lá viver a sua inquietação e ser
verdade aquela ânsia de fugir.
Não lhe cortem o cordel!
Poupem o papagaio à dor enorme
de cair
papel inútil, roto, pelo chão.

Não lhe ensinem,
ao pobre papagaio de papel,
que a sua inquietação
é a única força que ele tem.

Deixem-no lá,
naquela ânsia de fuga,
no sonho (a que uma navalha
pode dar o triste fim)
de fazer ninho no Céu:
Sempre anda longe da terra, assim,
o comprimento do cordel!...

Deixem-no lá, deixem-no lá,
o papagaio de papel!...

Sebastião da Gama, Verso Aqui, Verso Acolá

domingo, 28 de junho de 2015

QUEBRA-NOZES

   Quando as coisas não lhe corriam como pretendia, o Pedro ouvia a avó dizer:
   - Deixa lá! Um dia compro-te um quebra-nozes!
   O Pedro já não pensava em mais nada.
   - O que será um quebra-nozes? - perguntava a si mesmo.
   Como nunca tinha visto nenhum punha-se a imaginá-lo. Pensava num fruto parecido com uma noz, muito grande e alaranjado, com casca estaladiça. Outras vezes imaginava-o muito pequenino, mais insignificante que uma semente de nabiça. Para o comer seria necessário pô-lo oito dias dentro de um copo cheio de água, para que inchasse e se tornasse muito maior do que um ananás... mas sem aquela casca dura.
   Outras vezes suspirava:
   - Se fosse um quebra-cabeças eu já sabia! - e desatava a rir.
   Uma tarde, o Pedro lembrou-se de ir à estante procurar um dicionário velhinho que o pai consultava aos domingos para conseguir completar as palavras cruzadas do jornal.
   Esteve muito tempo à procura da palavra "quebra-nozes".
   Quando a descobriu leu devagarinho, com o coração aos pulos:
   Quebra-nozes - instrumento de metal para partir nozes.
   O Pedro ficou desconsolado: então aquilo é que era um quebra-nozes?!
   Ah, não podia ser!
   À noite, quando a avó voltou a prometer o quebra-nozes, o Pedro ficou a pensar um bocado. E depois disse assim:
   - Está bem, Vó. Mas a partir de hoje só aceito um quebra-nozes-da-imaginação. Pode ser?
   - Pode! - respondeu a avó, que logo se pôs a pensar como seria um quebra-nozes-da-imaginação.

António Mota, Abada de Histórias

sábado, 27 de junho de 2015

A VIDA É UM MILAGRE

A vida é um milagre.
Cada flor,
com sua forma, sua cor, seu aroma,
cada flor é um milagre.
Cada pássaro,
com sua plumagem, seu canto, seu voo,
cada pássaro é um milagre.
O espaço, infinito,
o espaço é um milagre.
O tempo, infinito,
o tempo é um milagre.
A memória é um milagre.
A consciência é um milagre.
Tudo é milagre.

Manuel Bandeira



sexta-feira, 26 de junho de 2015

ADIVINHA

Não é gato
Nem é cão

Mas quer caçar ratos
E ser guarda-portão

E tem orelhas e pêlo
como o leão.

Não é gato
Nem é cão

Mas gosta de fingir
Que toca violão

E se come bananas
Não come macarrão.

Não é gato
Nem é cão

Se lhe digo sim diz sim
Se lhe digo não diz não

E ninguém pode dizer
que tem muitra imaginação.

Não é gato
Nem é cão

Ninguém adivinha
Nem tem opinião?

Ou já todos sabem
Que é um __________ de imitação?

Maria Cândida Mendonça, O Livro do Faz-de-Conta

quinta-feira, 25 de junho de 2015

RETRATO

   Que linda que era a borboleta! Ai, tão linda que nem fazem ideia! As asas eram todas pintalgadas de azul e roxo, amarelo, cor de laranja e negro, e cobertas por um pó doirado, mais fino que o pó de oiro, mas muito mais! As antenas eram fininhas e arqueadas, como só podem ser duas antenas de borboleta. E os olhos? Os olhos eram muito redondos, muito verdes, muito vivos, com o brilho de duas gotas de orvalho. Mas essa borboleta tão bonita e cheia de qualidades - porque ainda por cima era asseada, inteligente e com jeito para tudo - tinha um grande defeito: era muito teimosa.

Ricardo Alberty, A Galinha Verde

terça-feira, 23 de junho de 2015

A MINHA BICICLETA

A minha bicicleta
só tem dois pedais;
Mas se monto nela
não tem dois, tem mais!

A minha bicicleta
tem um guiador
Quando monto nela...
... sou aviador!

No jardim onde ando
não vejo um canteiro...
Sou aviador,
vejo o mundo inteiro!

Voo mesmo a sério!...

Por cima das árvores
(não toco no chão!)
voo mesmo a sério,
vou de avião...

A minha bicicleta
também tem selim.
Mas eu nem me sento
gosto mais assim:

Pedalo em pé,
dá mais rapidez.
A minha bicicleta
é o que tu vês:

É um avião,
pois eu não te digo?!

Da próxima vez...

Da próxima vez
levo-te comigo?

Fernando Miguel Bernardes, Verso Aqui, Verso Acolá

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segunda-feira, 22 de junho de 2015

SOLA, SAPATO

Sola, sapato
Rei, rainha
Foi ao mar
Buscar sardinha
Para a mulher
Do juiz
Que está presa
Pelo nariz;
Salta a pulga 
Na balança
Que vai ter
Até à França
Os cavalos
A correr
As meninas
A aprender
Qual será 
A mais bonita
Que se vai
Esconder?

Lengalenga usada nas brincadeiras de infância.

domingo, 21 de junho de 2015

OS NOSSOS AMIGOS

Os campos que dão
o pão
feito do trigo
maduro
é com trabalho
duro
que o dão.

Então...
quem trabalha merece
a luz do livro
o sol
a mesa
o fofo do colchão;

mas aquele que tem
escola
e lanche
e livro
e não estuda...
é nosso amigo?
- Não...

Fernando Miguel Bernardes, O Grilo e o Seu Violão

Vincent Van Gogh

sábado, 20 de junho de 2015

O COELHO E O SAPO

   O coelho e o sapo eram amigos.
   Um dia resolveram ir os dois roubar marfim à Administração.
   Depois do roubo, resolveram passar pela povoação do régulo para comemorar o feito e começaram a beber beber até não poderem mais.
   Como toda a gente sabe, o sapo está sempre de boca aberta e a garganta a abanar. Quando o coelho viu aquilo pensou logo numa maneira de se livrar dele e ficar com o produto do roubo e começou a dizer em voz alta: "Então sapo, decides-te ou não a contar o que te sufoca a garganta?"
   O régulo e os seus conselheiros disseram entre eles: "Nós sabemos que desapareceu o marfim da Administração, vamos ficar atentos, o ladrão pode estar perto."
   O coelho continuava: "Anda sapo, tens vergonha ou medo? Não disseste que não aguentavas mais? Não disseste que te bastava beber dois copos para te decidires? Então sapo?"
   O sapo estava atordoado, não sabia onde é que o coelho queria chegar.
   O régulo mandou um auxiliar para perguntar: "Ei vocês, o que é que o sapo tem para contar?" "Nada, nada, senhor chefe" apressou-se a responder o sapo. Mas estava atrapalhado porque tinha bebido de mais e trocava as palavras, além disso a presença do auxiliar do régulo metia-lhe medo por causa do roubo do marfim. O sapo olhou para o coelho como a pedir para ser ele a explicar o que se passava: "Anda coelho, tu és esperto, responde aqui ao senhor chefe." O coelho disse: "Eu não posso dizer, o meu amigo pediu segredo... é melhor perguntar a ele próprio." E virando-se para o sapo: "Então, sapo, vais continuar com o problema entalado na garganta? Resolves ou não falar no roubo?..."
   O régulo, que já estava à espera disso, disse: "Eu já sabia que era o sapo quem tinha roubado o marfim do senhor Administrador. Vamos prendê-lo e levá-lo ao rei para ser julgado."
   Só então é que o sapo percebeu que o coelho fizera tudo aquilo para se livrar dele e ficar com o marfim só para si.

Lourenço J. C. Rosário, A Narrativa Africana



quarta-feira, 17 de junho de 2015

CÃO

Cão passageiro, cão estrito,
cão rasteiro cor de luva amarela,
apara-lápis, fraldiqueiro,
cão liquefeito, cão estafado,
cão de gravata pendente,
cão de orelhas engomadas,
de remexido rabo ausente,
cão ululante, cão coruscante,
cão magro, tétrico, maldito,
a desfazer-se num ganido,
a refazer-se num latido,
cão disparado: cão aqui,
cão além, e sempre cão.
Cão marrado, preso a um fio de cheiro,
cão a esburgar o osso
essencial do dia a dia,
cão estouvado de alegria,
cão formal da poesia,
cão-soneto de ão-ão bem martelado,
cão moído de pancada
e condoído do dono,
cão: esfera do sono,
cão de pura invenção, cão pré-fabricado,
cão-espelho, cão-cinzeiro, cão botija,
cão de olhos que afligem,
cão-problema...
Sai depressa, ó cão, deste poema!

Alexandre O'Neill, in Poesias Completas,
Assírio & Alvim



terça-feira, 16 de junho de 2015

POEMAS COLORIDOS

Fui um pedacinho de sol
que caiu de lá de cima.
Agora sou a cor amarela
dentro da tua aguarela.

Tudo verde
nos jardins e pinhais
Até que apareceu 
um girassol
Que bom!
Já não aguentava mais!

Teresa Guedes, Palavromanias

domingo, 14 de junho de 2015

A HISTÓRIA DE DAVID

   Vivia em Belém um pastor chamado David. Deus tinha-o escolhido para um dia ser o rei dos Hebreus.

David toca para o rei

   David tocava tão bem harpa que o rei Saul pedia-lhe para tocar para ele.
   A música tocada por David aliviava-o dos seus sofrimentos.

O gigante Golias

   Nesse tempo os Hebreus estavam em guerra com os Filisteus. Todos os dias um gigante de nome Golias os desafiava: "Venha um de vós bater-se comigo."
   Mas nenhum tinha coragem.

David e Golias

   David disse: "Eu estou aqui!" E apanhou do chão cinco pedras e avançou para o gigante, que se riu dele.
   Mas David disse: "Tu vens contra mim de espada, lança e escudo. Eu estou aqui em nome do Senhor!"
   Dizendo isto, fez girar a funda e lançou uma pedra que bateu em cheio na testa de Golias.
   Golias caiu morto e os Filisteus fugiram cheios de medo.

A Minha Primeira Bíblia, Verbo





David luta contra Golias

sábado, 13 de junho de 2015

TEMA e VARIAÇÕES

Sonhei ter sonhado
Que havia sonhado.

Em sonho lembrei-me
De um sonho passado:
O de ter sonhado
Que estava sonhando.

Sonhei ter sonhado...
Ter sonhado o quê?
Que havia sonhado
Estar com você.
Estar? Ter estado,
Que é tempo passado.

Um sonho presente
Um dia sonhei
Chorei de repente,
Pois vi, despertado,
Que tinha sonhado.

Manuel Bandeira, in 101 Poetas - Iniciação à Poesia em Língua Portuguesa,
 Ed. Caminho





sexta-feira, 12 de junho de 2015

FÁBULA da FÁBULA

Era uma vez
Uma fábula famosa,
Alimentícia
E moralizadora,
Que, em verso e prosa,
Toda  a gente
Inteligente
Prudente
E sabedora
Repetia
Aos filhos,
Aos netos
E aos bisnetos.
À base duns insetos,
De que não vale a pena fixar o nome,
A fábula garantia
Que quem cantava
Morria
De fome.

E, realmente,
Simplesmente,
Enquanto a fábula contava,
Um demónio secreto
Segredava
Ao ouvido secreto
De cada criatura
Que quem não cantava
Morria de fartura.

Miguel Torga, Diário VIII,
Coimbra Editora

quinta-feira, 11 de junho de 2015

OS PRIMEIROS TEMPOS DO MUNDO
(SEGUNDO OS GREGOS)

   No princípio, conta Hesíodo, era o Caos, abismo escuro e informe sem qualquer vida. Logo que este vazio primordial começa a adquirir forma, emergem forças antagónicas. De um lado, Nix (a Noite) e Érebo (o negro absoluto), do outro, Eros, "o Amor, que amacia as almas e, ao apoderar-se do coração de todas as divindades e de todos os homens, triunfa sobre as suas sábias vontades" (Hesíodo, Teogonia). Eros, o élan vital, não pode desempenhar plenamente o seu papel na ausência de homens e de mulheres, mas a sua presença já anuncia o nascimento de todas as coisas, o fim do caos. De Nix, que não pode existir sem a sua contraparte, nascem a Luz do Dia e Éter. A alternância do dia e da noite irá ritmar a vida dos homens, enquanto que Érebo, Éter, a "Luz pura e infinita", banha eternamente o reino dos deuses. De Nix nasce ainda Éris (a Discórdia), que - tal como Eros, não pode ainda exercer a sua influência nefasta, mas cujas filhas, Castigo, Esquecimento, Fome, Dor e Juramento, anunciam os tormentos dos homens vindouros.


quarta-feira, 10 de junho de 2015

A ORIGEM DO MUNDO
(segundo os celtas)

   Após o dilúvio, a raça dos Cessair ocupa as terras daquilo que virá a ser a Irlanda, mas desaparece totalmente. Depois, sucedem-se várias vagas de invasores, como a constituída pelo grego Partholon e pela vintena de casais que o acompanha, que se multiplicam durante 300 anos, antes de serem aniquilados por uma epidemia. Entre estes invasores, a tribo dos Tuatha Dé Danann ("os filhos de Danu"), oriunda da união da deusa Danu "a benfeitora" (Dôn, na Grã-Bretanha) e de Bilé, deus da morte (Béli para os antigos irlandeses), desempenha um papel fundamental na constituição do reino da Irlanda. Com efeito, foi esta tribo que derrotou os Fomorianos, monstros gigantes e disformes (uns apenas com um braço e uma perna, outros com cabeça de cabra...) em duas batalhas famosas, as batalhas de Mag Tuired.

terça-feira, 9 de junho de 2015

 A ORIGEM DO MUNDO
(segundo os indianos)

   Segundo várias lendas hindus, o universo era, na origem, uma vasta extensão de água, e o mundo terrestre ganhou forma a partir de um torrão de terra emergido das Águas Primordiais, como no mito egípcio, ou então de um Ovo Dourado, Hiraniagarba.
   O Ovo de Ouro flutua aqui e ali sobre as Águas Primordiais: "No decurso do ano, dele nasceu um ser. Esse ser era Prajapati, o Progenitor, senhor das criaturas. É por isso que, no espaço de um ano, a mulher, a vaca e a jumenta parem. Porque foi no espaço de um ano que nasceu Prajapati. Quebrou o Ovo de Ouro. Não tinha então qualquer ponto de apoio. Portanto, o Ovo de Ouro, ao levá-lo, flutuou por várias paragens no espaço de um ano".

(O Nascimento do Mundo, Fontes Orientais)



segunda-feira, 8 de junho de 2015

A ANDORINHA 
OU TUDO É RELATIVO

Da andorinha dificilmente se dirá
que é um animal feroz. Pelo contrário,
convém-lhe adjetivos como grácil.

Mas a grácil andorinha abre
Para o mosquito uma boca aterradora.

A. M. Pires Cabral, Arado,
 Cotovia
Escritor português





domingo, 7 de junho de 2015

COMO GIL EANES, NATURAL DE LAGOS, FOI O PRIMEIRO QUE PASSOU O CABO BOJADOR, E COMO LÁ TORNOU OUTRA VEZ, E COM ELE AFONSO GONÇALVES BALDAIA

   E finalmente, depois de doze anos, fez o Infante armar uma barca da qual deu a capitania a um Gil Eanes seu escudeiro, que ao depois fez cavaleiro e agasalhou mui bem, o qual segundo a viagem dos outros, tocado daquele mesmo temor, não chegou mais que às ilhas de Canária, donde trouxe certos cativos com que se tornou para o reino. E foi isto no ano de Jesus Cristo de mil quatrocentos e trinta e tres.
   Mas logo no ano seguinte, o Infante fez armar a dita barca, e, chamando Gil Eanes a de parte, o encarregou muito que todavia se trabalhasse de passar aquele Cabo; e que ainda que por aquela viagem mais não fizesse, aquilo teria por assaz.
   E o Infante era homem de mui grande autoridade pela qual suas admoestações, por grandes que fossem, eram para os sisudos de mui grande encargo, como se mostrou por obra em aqueste, que depois destas palavras determinou em sua vontade não tornar mais ante a presença de seu Senhor, sem certo recado daquilo por que o enviavam. Como de feito fez, que daquela viagem, menospreçando todo perigo, dobrou o cabo a alem, onde achou as cousas pelo contrario do que ele e os outros até ali presumiam.
   E então lhe contou todo o caso como passara, dizendo como fizera lançar o batel fora, no qual saíra em terra, onde não achara gente alguma, nem sinal de povoação.
   - "E porque, senhor - disse Gil Eanes -, me pareceu que devia trazer algum sinal de terra, pois que em ela saía, apanhei estas hervas que aqui apresento a Vossa Mercê, as quaes nós em este reino chamamos rosas de Santa Maria".

Gomes Eanes de Zurara, Crónica da Guiné (adaptação)

Gomes Eanes de Zurara, cronista régio no reinado de D. Afonso V, nasceu após 1410 e morreu entre 1473 e 1474.

sábado, 6 de junho de 2015

NA MINHA TERRA

Na minha terra
há uma estrada tão larga
que vai de uma berma à outra.

Feita tão de terra
que parece que não foi construída.
Simplesmente, descoberta.

Estrada tão comprida
que um homem
pode caminhar sozinho nela.

É uma estrada
por onde não se vai nem se volta.

Uma estrada
feita apenas para desaparecermos.

Mia Couto, Tradutor de Chuvas,
 Editorial Caminho

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O MITO DE OSÍRIS

   Segundo a crença egípcia, no início apenas existia o oceano e o deus  do sol, Ré. Este nasceu de uma flor de lótus e de um ovo e, quando surgiu à superfície da terra, trouxe consigo quatro crianças, os deuses Shu e Geb e as deusas Tefnut e Nut. Da união de Geb e Nut nasceram dois filhos, Osíris e Seth, e duas filhas, Ísis e Néftis. Osíris sucedeu a Ré como rei da terra, tendo sido apoiado pela sua esposa, Ísis.
   Seth, o deus-vento do deserto, era mau e invejoso. Tinha inveja da brisa fresca que soprava ao entardecer, que empurrava suavemente as velas dos barcos que subiam o Nilo e das águas fertilizantes do grande rio. Acima de tudo invejava o seu irmão Osíris, casado com a bela deusa da chuva, Ísis.
   Um dia, não conseguindo ultrapassar o ódio que o consumia, Seth matou Osíris, retalhando o seu corpo em pedaços que espalhou por todo o Egipto. Depois fomentou a desordem e a violência.
   Ísis chorou amargamente a morte do seu esposo amantíssimo. As sua lágrimas caíram sobre os campos, parecendo gotas de chuva refrescante. Noite e dia, Ísis procurou, sem parar, os restos mortais de Osíris por todo o Egipto. Por fim, a deusa, revolveu as entranhas da terra, recolhendo um a um todos os pedaços do corpo do seu amado marido. Auxiliada por Anúbis, o deus-chacal, embalsamou o corpo de Osíris, que ressuscitou, para voltar a reinar, triunfante e imortal. O ódio e a inveja já nada podem contra Osíris - com a coroa branca na cabeça e empunhando o cetro e o chicote, passou a presidir o julgamento dos mortos.
   Do grande amor de Ísis nasceu um filho, o deus-falcão Hórus, que ficou a reinar no Egipto em vez de seu pai. Mais tarde, Hórus derrotou Seth numa grande batalha e tornou-se senhor da terra.

Texto adaptado da Infopedia, Porto Editora


sexta-feira, 5 de junho de 2015

ADIVINHAS?

1

Sou gigante e gigantão,
Tenho doze filhos no meu coração,
De cada filho trinta netos,
Metade brancos, metade pretos.

2

Sou mais vasto do que o mar
E ninguém me pode ver;
Todo o mundo é meu lar,
Sem mim não podes viver.

3

Somos mais de mil irmãs
Negrinhas como o carvão
Mas não viemos de África
Nem lá temos geração.




Soluções: 1: O ano, os meses, os dias 2: O ar 3: As formigas

quinta-feira, 4 de junho de 2015

QUARENTA E TRÊS VEZES


   Ah, principezinho! Assim, aos poucos, fui ficando a conhecer a tua melancólica vidinha! Durante muito tempo, a tua única distração foi a beleza dos crepúsculos. Fiquei a sabê-lo na manhã do quarto dia, quando me dissestes:
   - Gosto muito dos pores do Sol. Vamos ver um pôr do Sol...
   - Mas primeiro temos de esperar...
   - Esperar o quê?
   - Esperar que o Sol se ponha.
   Começaste por ficar muito espantado, mas, depois, riste-te de ti próprio. E disseste-me:
   - Ainda julgo que estou lá no meu sítio...
   Pois é. Quando é meio dia nos Estados Unidos, toda a gente sabe que o Sol se está a pôr em França. Bastava poder chegar a França num minuto para se assistir ao pôr do Sol. Mas, infelizmente, a França fica longe demais. No teu planeta pequenino bastava puxares a cadeira um bocadinho mais para trás. E vias quantos crepúsculos quisesses...
   - Um dia vi o Sol pôr-se quarenta e três vezes!
   E pouco depois, acrescentastes:
   - Sabes... quando se está muito, muito triste, é bom ver o pôr do Sol...
   - E estavas assim tão triste no dia das quarenta e três vezes?
   Mas o principezinho não me respondeu.


Antoine de Saint-Exupéry, O Principezinho,
 Caravela

quarta-feira, 3 de junho de 2015

ANTOINE DE SAINT-EXUPÉRY
 (1900-1944)



   Nasceu em Lyon, numa família aristocrática, tendo iniciado jovem a carreira de piloto. Foi correspondente de guerra, na Guerra Civil de Espanha, ao lado dos antifascistas e, a partir de 1939, combateu as tropas alemãs, na II Guerra Mundial. Sofreu vários e graves acidentes, nomeadamente o que ocorreu em 1935, no Norte de África, que o deixou perdido no deserto durante cinco dias e poderá ter influenciado a escrita da sua obra-prima, O Principezinho. Em 1944, durante uma operação de reconhecimento, o seu avião foi abatido por um caça da força aérea de Hitler. Os destroços e o seu corpo não foram encontrados.





Aqueles que passam por nós, não vão sós, não nos deixam sós.
Deixam um pouco de si, levam um pouco de nós.

Saint-Exupéry


terça-feira, 2 de junho de 2015

FLORENÇA



   Florença é uma cidade luminosa onde os gatos adormecem ao sol e onde as tintas das telas têm mais brilho, tornando quase reais, quase tocáveis as figuras que nelas se encontram representadas. Cidade de pintores, viu nascer, ao longo de séculos, verdadeiros génios da cor e do traço, da forma e da luz.
   Já não me lembro, para ser sincero, quando foi que nasci nos arredores dessa cidade que cheirava a laranjas, a ervas aromáticas, a sabão e a rosas. Sei que foi há muito tempo, há tanto que não encontro em mim, por mais que o tente, sinal da data ou do lugar exato.
   Recordo-me apenas de um amigo, um rapaz da minha idade, pastor como eu, que saía comigo para os campos cobertos de giestas para apascentar o rebanho da família. Ambos gostávamos muito de desenhar, mas não tínhamos nem carvão, nem tela, nem papel. Só pedra e a argila pareciam ser capazes de receber, no meio dessa pobreza grande em que vivíamos, os traços bonitos que a nossa imaginação ditava.
   Às vezes, o meu amigo ficava horas a observar os contornos de uma árvore ou os movimentos de um pássaro ou de uma ovelha e parecia enfeitiçado por aquilo que os seus olhos viam. Eu não conseguia ver tanto e tão longe quanto ele. E chamava-lhe a atenção:
   - Se deixas o rebanho ao abandono, logo, ao voltares para casa terás de dar contas ao teu pai por levares animais a menos.
   Mas ele não parecia incomodar-se com os meus avisos. Os seus olhos negros e vivos andavam sempre em viagem por cima das coisas simples e belas que havia à nossa volta: um seixo, uma nuvem, a corola de uma flor, uma abelha atarefada na recolha do pólen. E nunca se cansava de olhar, de descobrir, de aprender. Os seus olhos, muito mais do que os meus, eram incansáveis viajantes à descoberta de cores, de formas, de mundos ocultos.
   Um dia disse-me:
   - Como eu gostava de pintar frescos tão bonitos como os que há na igreja de S. Martinho, mas não tenho tintas nem sei a maneira de as misturar.
   - Há de chegar um dia - consolava-o eu - em que hás de ter dinheiro e saber bastante para conseguires fazer isso e muito mais.
   Os seus olhos tornavam-se ainda mais brilhantes ao escutar estas palavras e eu não conseguia imaginar que fantásticos pensamentos lhe povoavam o espírito quando falávamos dessas coisas ainda tão distantes.



José Jorge Letria, Pelo Fio de Um Sonho


segunda-feira, 1 de junho de 2015

HISTÓRIA BONITA

É uma história muito bonita,
- Conte! Conte! Conte! -
é uma história muito bonita,
escutem, escutem, que eu vou contar.

E nesta história muito bonita
- Conte! Conte! Conte! -
e nesta história muito bonita
dançam as fadas à luz do luar.

A minha avó contou-ma a mim
quando eu era assim
como vocês...
- Conte! Conte! Conte! -

Era uma vez...

Afonso Lopes Vieira, Obra Poética


DIA DA CRIANÇA


Hoje, Dia da Criança, o meu voto de que todos os meninos e meninas possam ser crianças.


Arminda Fernandes