segunda-feira, 6 de julho de 2015

A  MAGIA DA LEITURA

   Sofia abre um livro e o livro torna-se caixinha de surpresas. Uma pomba branca, poisada a meio da página, enche-lhe os seus grandes olhos. Será uma pomba de verdade, assim impressa a cores, de asas estendidas e pronta a levantar voo?
   A ave, de cabecinha imóvel, estende o bico para diante e observa Sofia com atenção. Vai dar-lhe um beijo? Já lho deu? De repente bate as asas, levanta as patinhas cor-de-rosa de cima do papel e aí vai ela pelos ares, partindo em busca de ar livre.
   Sofia tem uma pomba livre dentro de um livro que guarda na estante, e quem o sabe? Agora ela já voa ao longe por cima de um areal, onde o bico penteia os fios de ouro  da cabeleira do Sol e com eles tece no ar um manto de luz mais radioso para alegrar o novo dia.
   Cintila o manto sobre o mar azul e cardumes de peixes de prata são atraídos à tona da água, onde ficam, encantados, a cantar. Passa a rede de uma traineira e leva-os em monte aos pescadores, que no barco em cantoria não cantam menos que os peixes.
   Depois irrompem da luz milhares de pombas brancas (é luz feita de pombas ou são pombas feitas de luz?) e as asas, em camada estendida no areal seco, palpitam como espumas de onda batida, cardume de peixes prateados ou penas a tremerem ao vento.
   Ao fim da tarde voam todas para o pombal, que se vê à beira de uma casa com gente lá dentro, a mexer, salas, quartos e corredores iluminados. E essa casa vivente é o livro aberto de Sofia, caixinha de surpresas.

Arsénio Mota, A Nuvem Cor-de-Rosa

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